O FUTURO DO PRESENTE: A BIOTECNOLOGIA E O PRETÉRITO IMPERFEITO DA HUMANIDADE. QUANDO O NIRVANA DE EXTINGUIR A FOME SE TORNOU UM PROBLEMA DE SEGURANÇA ALIMENTAR E AMBIENTAL?
Palavras-chave:
Segurança alimentar, Empresa, Direitos Humanos, Agronegócio sustentável, Meio ambienteResumo
Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro. Estavam cansados e famintos. A fome fictícia da catinga do Juazeiro, que se estendia de um barro vermelho indeciso salpicado por manchas brancas que eram ossadas, retratada por Graciliano Ramos em Vidas Secas ainda existe, mas agora é predominantemente política. Mais de dois séculos desde a revolução industrial, e a maioria da humanidade ignora a maneira que seus alimentos são produzidos e cultivados. Na indústria agropecuária brasileira não há mais segredos, pudores ou discrições capazes de omitirem a informação de que, em estabelecimentos de produção intensiva, quer em milho, soja, cana-de-açúcar ou, ainda, em seres vivos, a submissão a ambientes que desconsideram suas exigências e comportamentos instintivos são lugares repetidos, comuns. São inoculadores, solubilizadores, fertilizantes, nematicidas, fungicidas e diversas outras práticas de gestão, algumas vezes, inadequadas, desde a deficiente higiene a mutilações dolorosas, castração cirúrgica, corte de cauda, clipagem de dentes, desmame precoce e ambientes superlotados. Esse sistema insalubre motiva a utilização de antibióticos destinados a cura de infecções em emprego terapêutico, mas também, profilática, inclusive para fins de estimulação de crescimento. No entanto, o uso excessivo e imprudente favorece e intensifica o processo natural de seleção de microrganismos, provocando o surgimento de gerações de bactérias com múltipla resistência. Um problema sanitário dramático vivido no cotidiano. O resultado: Salmonella, Eimeria e Clostridium, entre outros. São as dores do progresso? Mas e o progresso, é sustentável? Uma resposta frequente diante de notícias positivas relacionadas à saúde, prosperidade e bem-estar é a crença de que tal situação é insustentável. Enquanto, de maneira exorbitante, dissemina-se a proliferação pelo mundo, consome-se de forma voraz os recursos naturais da Terra, demonstrando indiferença em relação à sua limitação, contaminando todo o entorno com poluição e resíduos, acelerando-se a chegada de um momento de prestação de contas com o meio ambiente. Indubitavelmente, não é presumível que a mera concepção de problemas ambientais seja uma verdade auto evidente. Sob a perspectiva individual, a Terra se apresenta como algo infinito, e os efeitos da humanidade sobre ela parecem desprovidos de relevância. Olhar o planeta sob a ótica científica, inquietante realidade se desvela. O escrutínio microscópico expõe a presença de poluentes que, sorrateiramente, envenenam, não apenas a espécie humana, mas também aquelas que veneramos e das quais somos interdependentes. Por outro lado, a análise macroscópica descortina os efeitos nefastos sobre o ecossistema, cujas repercussões, embora possam parecer imperceptíveis diante de cada ação isolada, somam-se numa tragédia saqueadora. Se a superpopulação, a exaustão dos recursos e a poluição não forem capazes de dizimar a humanidade, a mudança climática certamente o fará. Da fazenda à mesa, é preciso estabelecer confluência entre Direitos Humanos e a segurança alimentar no agronegócio, de modo a vencer o grande desafio: É possível resolver dores e reduzir custos para aumentar a produção e beneficiar o meio ambiente, prestigiando os estandartes reguladores interamericano, de modo a convergir interesses entre Direitos Humanos eEmpresas? Este trabalho, portanto, na qualidade de ensaio preliminar ao alvissareiro artigo científico que se aproxima, objetivando, ainda que superficialmente responder ao problema de pesquisa, se deteve a um estudo qualitativo, de cunho descritivo, com a realização de pesquisa bibliográfica, adotando-se como referencial teórico, o Informe Empresas e Direitos Humanos, apresentado por Soledad García Muñoz à CIDH.
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